quarta-feira, 2 de maio de 2018

Aos Invisíveis Mortos

(Sobre o incêndio de um prédio que abrigava excluídos sociais, na ultima segunda-feira, em São Paulo).
Quem País é Este
Quando o que o fogo encontra é a pobreza e a miséria onde se acomodam toda a sorte de excluídos, só o fogo vê. Só o fogo sabe. Ninguém morreu. Deu-se apenas a cobustão dos invisíveis.
Sim, invisíveis. Talvez o mendigo que você ignorou na semana passada, ou aquele pai que pediu a você um trocado porque tinha que comprar um leite para o filho (talvez esse filho também estivesse no prédio). Aquela criança do semáforo que você nem viu. Aquele mulher maltrapilha e suja para quem a madame vira o rosto para não a ver. O servente da construção do prédio ao lado do seu. Aquele “doido” que cantarolava na rua e você fechava os vidros por medo, quando ele estava por perto. Aquele adolescente que usava drogas a alguns quarteiros do seu.
Anônimos. Excluídos. Seres sem voz, sem sonho(?), que viviam sem nenhum “lugar ao sol” na metrópole mais rica do Brasil. Brasileiros? Ah, não! Eles não são. Para eles, o Brasil não existe. Então o fogo, em dia sonolento de um feriado nacional, resolve transformar em pó e cinzas aqueles pelos quais ninguém chora. Os invisíveis. Os imprestáveis às fotos oficiais do país.
Sem direito a sepulcro ou a crachás de identificação. Sem choro, sem nome e sem lágrimas, voltarão ao nada os que nada foram. E percebo que a morte nos iguala a todos do seu jeito macabro e frio: vejo claramente por meio destas mortes que nós, nação oficial, também muito pouco existimos.

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